quarta-feira, 26 de maio de 2010

Cabe indenização por danos morais decorrente da dissolução de casamento ou união estável?



Em decisão talvez inédita, o TJ de São Paulo livrou um homem do dever de indenizar sua ex-mulher. Ela pedia reparação por dano moral porque a causa da separação do casal foi o relacionamento homossexual do ex-marido.

Em primeiro grau, os danos morais foram concedidos. O ex-marido recorreu ao TJ/SP, que reconheceu que o relacionamento com o terceiro constituiu o motivo da separação, provocou aborrecimento e insatisfação, mas não configurou ato ilícito capaz de viabilizar a concessão de indenização.

Para o relator “quanto ao envolvimento do homem com outra pessoa do mesmo sexo, não há que se fazer distinção, em face do princípio constitucional da isonomia, pois inexiste na espécie qualquer fato vexatório excepcional a justificar a concessão da pretendida indenização, que não é devida pelo simples fato de cuidar-se de envolvimento homossexual”.

Ainda não me detive no tema, mas analisando superficialmente estou tendente a considerar acertada a decisão do TJ/SP, principalmente no tocante a não caber indenização por dano moral por envolvimento com pessoa do mesmo sexo.

Só que imagino que a questão deve ser resolvida em momento jurídico anterior: quando da discussão da própria responsabilidade civil, na medida em que uma de suas excludentes é o exercício regular de direito (art. 187, CC).

Destarte, os casos em que o dano moral é pedido em razão de dissolução de sociedade conjugal a questão deve morrer antes mesmo da discussão quanto à existência dos danos morais, posto que dissolver a sociedade conjugal é um direito concedido pelo ordenamento jurídico, portanto, não pode gerar responsabilidade civil.

Somente os casos de abuso de direito (quando se exerce um direito excedendo manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos costumes) é que se deve falar em ato ilícito e, então, discutir-se dano moral.

Assim, a dissolução da sociedade conjugal, independentemente dos motivos, é um exercício regular do direito.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Denúncia: "leite" Molico ActiFibras NÃO é leite!



Tive o maior choque na semana passada quando, lendo despretensiosamente o rótulo do "leite" Molico Actifibras, descobri que ele não é leite! Trata-se de composto lácteo.

O problema é que vem foto de um copo de leite, igual à foto do leite Molico real; ele é vendido na seção de leite, com preço de leite, anunciado pelos supermercados como leite, mas NÃO É LEITE!

Nesse caso, a Nestlé induz as pessoas a acreditarem que o produto é leite em pó e deveria ser proibida sua propaganda, assim como aconteceu ontem, também com a Nestlé, quanto à bebida Alpino Fast, que não contém chocolate Alpino, apesar de ter o mesmo nome e a mesma cor do chocolate e ainda trazer um bombom na embalagem.

Essa atitude da Nestlé pode se caracterizar como propaganda enganosa ou prática abusiva. No primeiro caso, por se enquadrar a situação no §1º do art. 37 do CDC, haja vista a informação contida no rótulo induzir em erro o consumidor a respeito da natureza e características do produto.

Também se enquadra como prática abusiva pois, pelo art. 39, IV do CDC, a Nestlé se prevalece da ignorância do consumidor para impingir-lhe um produto (composto lácteo).

sexta-feira, 14 de maio de 2010

Para refletir e descontrair...




No ano de 2050 a ciência evoluiu tanto, a ponto de conseguir captar os pensamentos dos fetos no ventre materno. Numa das primeiras captações, dois gêmeos se comunicavam. Dizia o primeiro:

- Você acredita em vida após o parto?

O segundo respondia:

- Não sei. Nunca ninguém voltou para contar...

Obrigação de dissecar animal vivo



Uma aluna de biologia da UFRJ ajuizou ação requerendo a dispensa das aulas práticas de vivissecção, onde dissecaria animais vivos com o propósito de realizar estudos de anatomia e fisiologia.

Ganhou a liminar, mas o TRF da 2ª Região a cassou por três argumentos: 1. tal prática é permitida pela legislação; 2. não há abuso na utilização dos animais e 3. o Judiciário não poderia ingressar no mérito da grade da faculdade.

Com isso, a nosso ver, o TRF julgou contrário à Constituição, que estabelece no art. 225, VII, o dever do Poder Público em:
VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
Cortar um animal vivo para estudar suas entranhas e vísceras, enquanto ele ainda tenta respirar, é dos atos mais cruéis que existem.

Não importa se é autorizado por legislação infraconstitucional, visto que ofende a Constituição e o Judicionário não pode se furtar de apreciar um ato ilegal, pois nesse caso não estaria adentrando no mérito de um ato administrativo, mas na sua ilegalidade, máxime, inconstitucionalidade.

quinta-feira, 13 de maio de 2010

Concurso para ex-alunos da UFAL publicarem suas monografias



É um desperdício ver trabalhos maravilhosos de TCC´s serem jogados no lixo, sem oportunidade de publicação.

Parece que a UFAL começou a perceber a importância dos TCC`s e divulgou um Edital para seleção de artigos oriundos de TCC, com inscrições até 11 de junho.

A seleção é aberta à participação de qualquer estudante da Universidade Federal de Alagoas que tenha apresentado o TCC no segundo semestre do ano letivo de 2009 e que seja inédito.

O ideal, porém, era que constasse na própria ata da defesa um espaço para a banca indicar o trabalho à publicação e ele ser encaminhado diretamente à EDUFAL para esse fim.

Bem, de qualquer forma, esse já foi um passo positivo.

Quem tiver interesse, confira o edital.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

A mediação de conflitos


A mediação é um mecanismo não-adversarial e voluntário de resolução de controvérsias, onde um terceiro imparcial (mediador) auxilia a comunicação entre dois ou mais indivíduos em conflito por meio da utilização de determinadas técnicas com o intuito de que as próprias pessoas resolvam o impasse de maneira consciente. É extremamente pacificador.

O mediador não decide; quem decide são as partes. O mediador, utilizando habilidade e as técnicas da arte de mediar, leva as partes a decidirem.


A mediação não é terapia, mas envolve um pouco de psicologia.
A mediação não é Direito, mas envolve conhecimentos jurídicos.
A mediação não é apenas bom senso, mas sem bom senso não se consegue mediar.

Ela pode ser utilizada em qualquer conflito que possa ser resolvido por meio de diálogo e em todos em que seja possível acordo.

Qualquer pessoa física ou jurídica pode se valer da mediação em diversas áreas conflituosas, como no âmbito familiar, trabalhista, ambiental, empresarial, consumerista, dentre outras.

Na mediação, os casos parecidos não precisam ser resolvidos de forma idêntica, como acontece no Judiciário, pois como são as partes que definem suas soluções, a criatividade impera e, como cada caso é um caso que pode ter uma solução diferente, a solução de uma pessoa pode não se aplicar à outra.

Impera a ideia de que cada conflito é diverso e a forma de tratá-lo também, assim como ocorre na medicina quanto ao organismo.

 
O benefício da mediação é que ela resolve não apenas o conflito exposto, mas o conflito oculto, pacificando e modificando verdadeiramente as partes, na medida em que serve como processo educativo e gera uma nova forma de ver o mundo, para além de evitar futuros conflitos.

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sexta-feira, 7 de maio de 2010

Comediante processada por fazer piadas de sogra


A comediante Sunda Croonquist, uma stand-up norte-americana, foi processada por fazer piadas de sogra – pela sua própria sogra.

Sunda sempre fez seus números descrevendo sua história como uma mulher que é filha de negros e de suecos, casou-se com um judeu - de quem gosta - mas tem que conviver com a família dele.

A ação tramitava há dois anos – movida pela sogra, pela cunhada e pelo cunhado – que verberavam que as piadas dela os expunham ao ridículo.

A juíza federal Mary L. Cooper, de New Jersey, julgou a ação improcedente, porque considerou que "os exemplos que os acusadores citaram como ofensivos – inclusive uma delas em que ela compara a voz da cunhada com o miado de uma gata no cio – são declarações de opinião e não fatos e e, por isso, ela é protegida pela Primeira Emenda da Constituição dos EUA.

O mais irônico é que o marido de Sunda, Mark Zafrin, advogado, foi quem atuou em nome da comediante, no tribunal, contra sua mãe e seus irmão. (Com informações da CBC News).

Fonte: www.espacovital.com.br

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Concurso de monografia internacional



Com o tema “Princípio da motivação das decisões judiciais“ foi lançada a quarta edição do concurso internacional de monografias, promovido pela Comissão Ibero-americana de Ética Judicial (CIEJ). As inscrições já estão abertas.

O tema da nova edição do concurso foi aprovado na reunião da comissão, realizada em Madri, na Espanha, em dezembro de 2009. O regulamento e o cronograma do concurso podem ser consultados pelo site www.cidej.org.

Os alunos que quiserem participar do Concurso, basta me mandar um e-mail (cavalcanticunha@hotmail.com) para que possa orientá-los.

Boa-fé objetiva e venire contra factum proprium

O princípio do venire contra factum proprium trata-se de um corolário do princípio da boa-fé objetiva, que proíbe agir contra fato próprio, ou seja, proíbe a existência de condutas contraditórias (opostas) oriundas da mesma pessoa.

Os pressupostos para caracterização do venire contra factum proprium são: 1. conduta inicial séria e direcionada a uma finalidade e 2. conduta posterior da mesma pessoa, porém, contrária à conduta e à finalidade iniciais.

A conduta inicial não pode ser duvidosa, cambaleante, com objeções. Há de ser séria quanto à finalidade desejada, na medida em que deve demonstrar a intenção de quem age. Esta análise é feita a partir de critérios objetivos e não subjetivos, ou seja, a seriedade da conduta há de ser verificada de modo que qualquer pessoa a identificaria e não apenas de modo que apenas a outra parte a identifique.

É na conduta posterior da mesma pessoa, ou seja, no segundo pressuposto, que se encontra o cerne do instituto, visto que se tal inexistir, inexiste a ação contrária, conseqüentemente, não estará caracterizado o venire contra factum proprium.
Não é, no entanto, qualquer comportamento posterior contrário que preencherá o segundo pressuposto. Ele há de ser grave e rejeitar a finalidade inicial. Há de existir, então, um choque entre as duas condutas e as duas finalidades. Assim é que se a parte age de determinada forma em direção a um fim e, posteriormente, age de outra forma em direção ao mesmo fim não se encontra presente o pressuposto.

Todos os pressupostos são objetivos, razão pela qual não se deve considerar nem a criação de expectativas nem a confiança depositada pela parte que não possuiu o comportamento contraditório. Isto se explica por dois motivos: a) existirá violação ao princípio do venire contra factum proprium, quando presentes os pressupostos acima, tanto se a parte confiou quanto se a parte não confiou, tanto se a parte criou expectativas quanto se a parte não criou expectativas e b) a expectativa e a confiança representam “estados de espírito”, e portanto, são critérios de avaliação subjetivos, segundo José de Oliveira Ascensão, Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, em palestra proferida no Seminário do Núcleo de Estudantes luso-brasileiro da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa em Maio de 2006. Conseqüentemente, são difíceis de provar.

A ilicitude da segunda conduta exsurge, então, do exame coeso do todo, pois à medida que a segunda conduta contrapõe a primeira ela contraria a ordem pública e viola o princípio de que todos devem se pautar por condutas leais e honestas (princípio da boa-fé objetiva), sendo, assim, ilícita.

Tratando-se de ato ilícito, aplica-se o regime jurídico da responsabilidade extracontratual, portanto, qualquer investimento realizado por quem não agiu de modo contraditório deve ser indenizado nos termos dos art. 927 c/c 944 e ss. do Código Civil.

Erros de português no Judiciário


Errar é humano. Por isso, para mim, é perfeitamente compreensível errar uma vírgula ou coisa do tipo.

Mas o que aconteceu a essa decisão jurídica já é demais! Destaquei os piores erros!

Proc. nº 001/1.10.0020865-7 - A. Ulderigo Rossi Indústria de Máquinas Gráficas Ltda (pp. Caio Amauri Varga) X Diretor Divisão Licitações da CORAG - Cia Riograndense Artes Gráficas e Biscaíno Automação Industrial Ltda (sem representação nos autos).

"Vistos etc depreendente que o carne do presente insurgimento esta atrelado a desição do recurso administrativo onde segundo a impretante falta a devida fuldamentação lato senso logico que ai esta o merecimento ao mandamus todavia o titulo de apreciação da liminar tenho que não ha por hora elementos de sustentação para o deferimento evidente que apos o contraditorio podera o contexto adquirir outras luzes com nova e nessesaria analise portanteindefiro a liminar solicitem-se as informações intimem-se".

Na análise do recurso à decisão, o desembargador não poupou críticas ao mau serviço público prestado pelo servidor despreparado:

"É de se lamentar a absurda cópia da decisão agravada, para fins de publicação no Diário da Justiça Eletrônico, dando o funcionário mostras ululantes de não ter condições de ocupar o posto, visto não ter conhecimentos mínimos de português, expondo o próprio ilustre magistrado ao ridículo, pois não há ponto, não há vírgula, acentos todos abolidos e letra maiúscula apenas uma da palavra "Vistos". Em suma, o tal internetês, perto, é machadiano".

Maiores informações e comentários em: http://www.espacovital.com.br/noticia_ler.php?id=18476.

segunda-feira, 3 de maio de 2010

Vitimologia - Carta a um amigo

Há uma nítida inversão de valores na sociedade que privilegia os direitos dos acusados e presos e desconsidera os direitos das vítimas. Basta ver quantos dispositivos a CF/88 endereçou aos acusados e presos e quantos endereçou às vítimas. Existe apenas um artigo (art. 245) que menciona o direito à reparação de (algumas) vítimas, mas que prescisa ser regulamentado e NUNCA foi nos quase 22 anos da CF/88. Enquanto isso, todos os direitos dos presos e acusados possuíam aplicação imediata, independente de regulamento.

Não acredito que o jogo seja de palavras, mas de respeito às vítimas, pois elas também são seres humanos, que precisam de direitos respeitados, tudo também com dignidade. Eu fiz uma pesquisa de campo acerca da concepção de justiça para as vítimas de crime, publicada no Brasil e em Portugal, mas o que mais impressionou foi o descaso e as acusações que elas sofrem seja nas delegacias ou nos Fóruns.

Apesar de desconhecida, existe a Declaração Universal dos Direitos das Vítimas, que estabelece como seus direitos: respeito, proteção, dignidade, prevenção, punição do criminoso, indenização (lato senso) e justiça – sendo esta obtida através da efetividade de todos estes outros. Ela é suscitada ou aplicada no Brasil? Não.

Lembrem-se que para respeitar a vítima não precisamos massacrar o criminoso ou vilipendiar direitos seus, apenas cortar excessos, se existirem, para que a situação de ambos seja, ao menos, igualada.

Vitimologia II - Carta a uma amiga - Reflexões de um texto

Eu estava mesmo para lhe escrever por esses dias para lhe dizer como fiquei chocada com a resposta que ouvi de meus estudantes quando perguntados se "matar alguém" era relevante para o Direito (na tentativa de diferenciar um fato qualquer de um suporte fáctico). A resposta foi que "dependia, pois se fosse alguém que eles conhecessem era importante. Se não fosse, não era importante". Venho refletindo muito a respeito e, sinceramente, ainda não encontrei uma justificativa plausível. Será que nossa sociedade está tão acostumada com a situação atual que já não liga para mais nada que não lhe afeta? Seria uma espécie de "capa protetora" para não passar o "Jornal Nacional" (ou outro qualquer) todinho chorando com as desgraças que ocorrem diariamente no Brasil?

Esta passividade diante do absurdo a que chegamos é que é incompreensível. Assim como é incompreensível o fato de rirmos de situações que nos deveriam assustar e servir de propulsor a que lutássemos por condições dignas de vida. A título de exemplo, menciono o caso de um outro aluno meu que sofreu uma tentativa de homicídio. No primeiro dia que compareceu à aula depois do atentado à sua vida, quando chamei seu nome, um outro aluno falou alto: "Ele está vivo" e esta "piada" foi motivo suficiente para que
a sala toda risse. Também não entendo o motivo. Tentativa de Homicídio agora virou motivo de piada?

Aí a Sra. afirma que "se o povo brasileiro é babaca, é porque nao teve oportunidade, não aprende, não cresceu numa sociedade democrática, numa sociedade igualitária, onde nossos direitos são respeitados". Concordo. Mas se ele é babaca é porque também não luta contra isso, é porque se conforma com o que tiver. Note que a Sra. apenas explica a razão disto acontecer e o texto descreve (de forma chocante e não científica) alguns efeitos
dessa falta de oportunidade e dessa falta de igualdade. Agora eu pergunto: quem pode fazer com que nossos direitos sejam respeitados somos nós ou um terceiro?

De todo modo, não consegui vislumbrar no texto nenhum indício de que "o autor" tenha acusado as ONG´S pela nossa desgraça, pela nossa passividade. O que me parece tenha ocorrido foi que as acusou de apenas defender direitos de alguns, quando, em verdade, os "direitos humanos" deveriam defender os direitos de todos - não importa quem seja. E, nesse aspecto, concordo com o texto. Não sei se tal se deve ao fato de que os
movimentos de "direitos humanos" apenas aparecem na mídia ligados a questões de defesa dos direitos dos acusados e nunca aparecem nas questões ligadas à defesa dos direitos básicos "de todo e qualquer cidadão". Isto, por si, não estaria errado, até mesmo porque todos os acusados também devem ter seus direitos protegidos, pois são cidadãos.
Mas é como se os outros cidadãos se sentissem excluídos com esta atenção especial.

A questão, então, gira em torno do direito à igualdade: porque só se defendem os direitos "deles" mas nunca os "meus"? Porque ninguém "me" protege? Aí resta uma certa indignação, como um "ciúme de irmão": você sabe que a mãe pode amá-lo e protegê-lo, mas
você quer o mesmo amor e a mesma proteção. Como o Estado não pode dar amor, o cidadão quer a mesma proteção e, quando isto não ocorre, quer a mesma defesa voraz de seus
direitos. Isto é o que deseja a maioria do povo brasileiro. Isto é o que não recebe o povo brasileiro. Eis, então, o simulacro hipócrita mencionado no texto.

Nada mais verdadeiro: a vítima quer ser ouvida, considerada. Não quer, então, que defendam os acusados de seus crimes sem que ela possa se defender ou, ainda, sem que ela possa ser defendida. Mas, tirando os Centros de Apoio às Vítimas de Crime espalhados pelo Brasil e outras poucas iniciativas, não podemos dizer que o Estado brasileiro e a maioria dos movimentos que se auto-proclamam como de direitos humanos efetivamente protejam ou defendam os direitos humanos das vítimas.

Por tudo isto é que não considero o texto apócrifo de "porcaria". Como todo texto, deve ser interpretado. Eis a minha interpretação. Talvez essa minha interpretação esteja comprometida diante dos acontecimentos da minha vida, não posso negar. Mas se um "assassino" pode tirar a vida de alguém sob o manto sagrado de argumentos
sociais que o impossibilitaram de ter acesso à educação, trabalho e saúde, acredito que eu também tenha esse mesmo direito, sob o argumento de que tive meus sogros assassinados por jagunços confessos de um suplente de ex-Deputado que queria uma vaga na Câmara, já que nunca nenhum movimento que se auto-proclama de "direitos humanos" acenou na defesa dos "direitos humanos dessas vítimas" à punição e, após quase doze anos de MUITO sofrimento, os seus assassinos encontram-se soltos e não existe previsão para julgamento.

Também me falta o conhecimento aprofundado do Direito Penal. Também me falta cientificidade jurídica nos argumentos. Porém, conclui recentemente que também não me interessa lutar para conseguí-los, pois nunca vou conseguir atingir a inteligência de penalistas e
juristas , como os que construíram a Constituição Federal excluindo os direitos das vítimas ou ainda os que, na tentativa de defenderem o que chamam de direitos humanos, apenas se manifestam e defendem os direitos dos acusados,como se existisse uma hierarquia entre os mesmos e os direitos das vítimas.

Na minha quase inútil ignorância, existem "direitos de acusados" que, ou foram criados ou passaram a ser interpretados para facilitar a impunidade. Se o obstáculo à punição se encontra, como argumentam alguns, nas leis e na própria Constituição, é tempo, então, de
re-avaliá-las. O momento social já começa a pedir isso. O povo brasileiro começa lentamente a questionar os valores insertos na Constituição. Nesta re-avaliação, o ideal seria, então, tentar proteger os direitos humanos realmente - o que seria possível no âmbito penal equilibrando os direitos dos acusados com os direitos das vítimas, mas nunca excluir qualquer deles, como acontece no Brasil com os últimos.

Acredito que a discussão seja sadia, assim como o respeito aos pontos de vista, pois quando um assunto se torna inquestionável ou quase proibido - como o suscitado direitos dos bandidos - quando as pessoas começam a ser "taxadas" ao defenderem pontos de vista diferentes (neste caso apenas o direito à igualdade), significa que estamos perdendo o Estado Democrático de Direito e a autonomonia intelectual.

Por fim, gostaria de lembrar que em palestra ocorrida em 2007 acerca dos Direitos Humanos, Francisco Rezek defendeu que os direitos humanos não são apenas violações do Estado contra os indivíduos, mas, também, violações particulares contra particulares, o que corrobora nossa posição.

Vitimologia - Carta a um amigo

Há uma nítida inversão de valores na sociedade que privilegia os direitos dos acusados e presos e desconsidera os direitos das vítimas. Basta ver quantos dispositivos a CF/88 endereçou aos acusados e presos e quantos endereçou às vítimas. Existe apenas um artigo (art. 245) que menciona o direito à reparação de (algumas) vítimas, mas que prescisa ser regulamentado e NUNCA foi nos quase 22 anos da CF/88. Enquanto isso, todos os direitos dos presos e acusados possuíam aplicação imediata, independente de regulamento.

Não acredito que o jogo seja de palavras, mas de respeito às vítimas, pois elas também são seres humanos, que precisam de direitos respeitados, tudo também com dignidade. Eu fiz uma pesquisa de campo acerca da concepção de justiça para as vítimas de crime, publicada no Brasil e em Portugal, mas o que mais impressionou foi o descaso e as acusações que elas sofrem seja nas delegacias ou nos Fóruns.

Apesar de desconhecida, existe a Declaração Universal dos Direitos das Vítimas, que estabelece como seus direitos: respeito, proteção, dignidade, prevenção, punição do criminoso, indenização (lato senso) e justiça – sendo esta obtida através da efetividade de todos estes outros. Ela é suscitada ou aplicada no Brasil? Não.

Lembrem-se que para respeitar a vítima não precisamos massacrar o criminoso ou vilipendiar direitos seus, apenas cortar excessos, se existirem, para que a situação de ambos seja, ao menos, igualada.